A Tapeçaria Sagrada dos Andes: Mitos de Criação, Fundação e o Poder da Natureza

 Uma Jornada Através das Lendas que Moldaram a Cosmovisão Andina

História Viva com a Prof.ª Socorro Macêdo

A mitologia dos povos andinos, rica e multifacetada, oferece uma visão fascinante sobre a origem do universo, a fundação de seu grandioso império e a profunda conexão espiritual com a natureza. De deuses criadores a heróis fundadores e espíritos das montanhas, essas narrativas ancestrais moldaram a cosmovisão, as práticas religiosas e a própria identidade cultural das civilizações que floresceram nos imponentes Andes.

1. Viracocha: O Deus Criador e as Origens do Mundo Andino

No princípio, antes que o sol iluminasse os picos nevados e os vales férteis, existia apenas a escuridão. Dela emergiu Viracocha, o deus criador supremo, frequentemente associado às águas primordiais do sagrado Lago Titicaca. De suas profundezas, ou em algumas versões, do vazio, Viracocha deu forma ao universo e à própria humanidade.

As lendas contam que Viracocha não criou o mundo em um único intento. Ele teria engendrado e destruído mundos anteriores, povoados por raças de gigantes ou outros seres imperfeitos. Frustrado com suas criações iniciais, Viracocha embarcou na tarefa de modelar a humanidade atual. As narrativas variam, descrevendo-o criando os primeiros humanos a partir do barro ou da pedra, e fazendo-os emergir de cavernas ou do próprio solo. Esses locais de emergência, conhecidos como pacarinas, eram considerados sagrados e pontos de conexão com as origens.

Em um mundo ainda envolto em trevas, Viracocha também realizou o ato primordial de trazer a luz. Ele teria criado o Sol (Inti), a Lua (Mama Killa) e as estrelas, ordenando-lhes que iluminassem o céu e trouxessem ordem ao cosmos.

Viracocha é retratado como um demiurgo complexo, possuindo tanto o poder de criar quanto o de destruir. Sua emergência do Lago Titicaca confere a este corpo d'água uma importância central como berço da criação na cosmovisão andina. Este mito fundamental não apenas explicava a origem do mundo, mas também estabelecia a autoridade divina e a sacralidade da vida para os povos andinos.

2. A Fundação do Império Inca: Lendas de Manco Cápac e os Irmãos Ayar

Após a criação do mundo e da humanidade, a mitologia andina se volta para as origens de seu mais célebre império: o Inca. Duas lendas principais narram a fundação de Cusco, o coração do Tawantinsuyu.

A mais difundida é a história de Manco Cápac e Mama Ocllo. Enviados pelo deus Sol, Inti, seus próprios filhos emergiram das águas do Lago Titicaca (em algumas versões, de uma caverna). Inti lhes confiou um bastão de ouro, instruindo-os a viajar e fundar uma cidade no local onde o bastão afundasse facilmente na terra, um sinal da fertilidade do solo. Após uma longa jornada, o bastão finalmente penetrou a terra no vale de Cusco, marcando o local sagrado para a construção de sua capital. Manco Cápac e Mama Ocllo ensinaram então aos povos que ali viviam a agricultura, as artes, a tecelagem e os princípios da civilização.

Uma lenda mais antiga e complexa é a dos Irmãos Ayar. Quatro irmãos – Ayar Manco, Ayar Cachi, Ayar Uchu e Ayar Auca – e suas respectivas irmãs emergiram da caverna sagrada de Pacaritambo. Cada irmão possuía habilidades e características únicas. Ayar Cachi era extremamente poderoso, com força capaz de destruir montanhas com um simples estilingue, o que gerou ciúmes em seus irmãos, que o enganaram e o trancaram dentro da caverna. Os irmãos restantes continuaram sua jornada rumo a Cusco, enfrentando desafios e transformações. Ayar Uchu se transformou em uma rocha para marcar a posse das terras, e Ayar Auca desapareceu ou se transformou em outra formação rochosa. Finalmente, apenas Ayar Manco, renomeado Manco Cápac, chegou ao vale de Cusco e fundou a cidade.

Comparar essas duas lendas revela diferentes perspectivas sobre a origem do poder Inca. Enquanto a lenda de Manco Cápac e Mama Ocllo enfatiza a origem divina e a missão civilizadora, a dos Irmãos Ayar ressalta a superação de obstáculos, rivalidades e sacrifícios na jornada para a fundação do império. Ambas as narrativas, no entanto, convergiam para legitimar o domínio dos Incas e a centralidade sagrada de Cusco em seu vasto território.

3. Pachamama e os Apus: O Poder da Natureza e os Espíritos das Montanhas

A cosmovisão andina era intrinsecamente ligada à natureza, vista não apenas como um recurso, mas como uma entidade viva e sagrada. Pachamama, a "Mãe Terra", ocupava um lugar central como a deusa da fertilidade, da terra, da colheita e do tempo. Ela era reverenciada em todos os aspectos da vida cotidiana, especialmente nos rituais agrícolas, onde oferendas (pagamentos à terra) eram realizadas para garantir boas colheitas e a prosperidade. Pachamama representava a fonte de toda a vida e a receptora final de tudo o que morria, simbolizando um ciclo contínuo.

Dominando a paisagem andina, os imponentes picos das montanhas eram considerados moradas de espíritos poderosos, os Apus. Esses espíritos eram vistos como divindades protetoras das comunidades e dos rebanhos, influenciando o clima, a disponibilidade de água e a fertilidade da terra. Cada Apu possuía sua própria personalidade, história e domínio específico, sendo reverenciado com rituais e oferendas individuais. Acreditava-se que desrespeitar os Apus poderia trazer desastres naturais ou má sorte.

A relação entre os humanos e essas divindades naturais era baseada no princípio da reciprocidade (ayni). Assim como a terra e as montanhas forneciam sustento e proteção, os humanos tinham a obrigação de honrá-las com oferendas, rituais e respeito. Essa cosmovisão que via a natureza como viva e sagrada moldou as práticas agrícolas, a organização social e a espiritualidade dos povos andinos, e continua a ter relevância para as comunidades contemporâneas, influenciando suas práticas de sustentabilidade e sua profunda conexão com sua identidade cultural.

4. Criaturas e Seres Sobrenaturais dos Andes

Para além dos deuses criadores e dos espíritos da natureza, o imaginário andino era povoado por uma rica variedade de criaturas e seres sobrenaturais que habitavam as montanhas, os lagos e os vales. Essas entidades, muitas vezes ambivalentes, podiam ser tanto protetoras quanto perigosas, e suas histórias serviam como avisos, explicações para fenômenos naturais ou simplesmente como parte do rico folclore local. (O artigo seria expandido aqui se a solicitação original incluísse detalhes sobre essas criaturas).

Em suma, a mitologia andina é um tesouro de narrativas que revelam a profunda compreensão que esses povos tinham do mundo ao seu redor e seu lugar dentro dele. Os mitos de Viracocha, a fundação do Império Inca e a reverência por Pachamama e os Apus são apenas algumas das muitas histórias que continuam a inspirar e a moldar a identidade cultural dos povos andinos até os dias de hoje.

História Viva com a Prof.ª Socorro Macêdo




História Viva com a Prof.ª Socorro Macêdo

Professora Licenciada em História com especialização em Gestão Escolar. Trabalhei por 26 anos na rede municipal. Gosto de aprender sobre Educação e tecnologia.

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