Hatshepsut: A Mulher que Se Tornou Faraó

 

O Brilho de uma Rainha-Rei e o Desafio ao Paradigma Egípcio

História Viva com a Prof.ª Socorro Macêdo

A história do Antigo Egito é uma tapeçaria de deuses, mistérios e faraós, mas poucas figuras brilham com o mesmo fulgor audacioso de Hatshepsut (c. 1507–1458 a.C.). Ela não foi apenas uma rainha, mas uma das raras mulheres a assumir o título e os plenos poderes de Faraó, governando no auge da XVIII Dinastia, durante o período conhecido como Novo Império. Sua ascensão foi um ato de astúcia política e desafio aos dogmas de um reino dominado por homens.

A Ascensão ao Trono: De Regente a Faraó

Hatshepsut era filha de Tutmés I e da Grande Esposa Real Ahmés. Sua linhagem pura e seu casamento com seu meio-irmão, Tutmés II, estabeleceram sua posição. Quando Tutmés II morreu, o herdeiro legítimo, Tutmés III, era apenas uma criança. Hatshepsut inicialmente assumiu o papel tradicional de regente, governando em nome do jovem enteado.

No entanto, após cerca de sete anos como regente, Hatshepsut deu o passo sem precedentes: ela se declarou Faraó. Para legitimar essa tomada de poder, ela recorreu a uma intensa campanha de propaganda, alegando que o deus Amón havia aparecido para sua mãe e a concebido, tornando-a uma descendente divina e, portanto, a governante legítima.

A Construção da Imagem Real: A Faraó Barbad

Para cumprir as exigências rituais e visuais do cargo de Faraó, Hatshepsut adotou a iconografia masculina completa. Ela se vestia com as roupas tradicionais dos faraós, que incluíam o khat (o toucado), o shendyt (o kilt) e, de forma mais notável, a barba postiça cerimonial.

Em seus monumentos, ela era frequentemente retratada com um corpo andrógino ou até mesmo masculino, embora em outras representações mantivesse suas características femininas. Essa dualidade iconográfica era crucial: ela era tanto a mulher de linhagem pura quanto o "Rei" masculino exigido para manter a ordem cósmica (Ma'at) no Egito.

Um Reinado de Paz e Prosperidad

O reinado de Hatshepsut, que durou mais de 20 anos (c. 1479–1458 a.C.), foi notável por sua paz, estabilidade e prosperidade econômica. Diferentemente de muitos de seus sucessores e antecessores que se concentraram em campanhas militares, Hatshepsut focou em vastos projetos de construção e na expansão comercial.

1. O Templo de Deir El-Bahari

Sua maior obra arquitetônica é o templo funerário de Djeser-Djeseru (Santo dos Santos) em Deir el-Bahari. Este complexo em terraços, construído no lado oeste do Nilo, é uma obra-prima da arquitetura egípcia, apresentando belos pórticos e relevos detalhados que narram sua linhagem divina e seus grandes feitos.

2. A Expedição a Punt

Um dos eventos mais célebres do seu reinado foi a expedição comercial à Terra de Punt (provavelmente localizada na região da Eritreia ou Somália moderna). Os relevos em Deir el-Bahari registram a viagem e o retorno de navios carregados de riquezas exóticas, incluindo incenso, mirra, ébano, marfim e animais vivos. Essa expedição revitalizou o comércio egípcio e demonstrou sua capacidade de projetar poder além das fronteiras.

A Memória Silenciada e a Revanche Póstuma

Após a morte de Hatshepsut, Tutmés III, o herdeiro que ela havia marginalizado, finalmente assumiu o poder por completo. Curiosamente, nos anos finais de seu reinado, e mais intensamente após sua morte, houve uma campanha sistemática para apagar a memória de Hatshepsut da história.

Seus cartuchos e imagens foram vandalizados, seus monumentos demolidos ou reescritos com o nome de Tutmés III. O motivo exato é debatido: alguns acreditam que foi uma "vingança" do enteado, enquanto outros veem isso como uma tentativa de restaurar a ordem dinástica e evitar um precedente para futuras mulheres ambiciosas que pudessem perturbar a sucessão masculina.

Apesar da tentativa de apagamento histórico, a arqueologia moderna, especialmente a descoberta de seus templos e sarcófagos, resgatou Hatshepsut, cimentando seu lugar como uma das faraós mais bem-sucedidas e intrigantes da história egípcia.

História Viva com a Prof.ª Socorro Macêdo


História Viva com a Prof.ª Socorro Macêdo

Professora Licenciada em História com especialização em Gestão Escolar. Trabalhei por 26 anos na rede municipal. Gosto de aprender sobre Educação e tecnologia.

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